28 de fevereiro de 2012

The Scream de mim

E do outro lado da lua formou-se uma fronteira que não se pode mais  apagar. São sóis vibrantes que não param de queimar as últimas cartas vindas do sul. São estômagos inteiros gritando um pouco de poesia, enquanto de suas bocas já não sai nenhuma palavra, sequer ruídos. Seu feedback demorou muito a chegar, e eu logo respondi com outra pergunta aquilo que já não podia mais ser questionado. Quantas são as estrelas deste céu? E do outro lado, ainda há de haver outras mais? O outro lado é sempre um mistério. E as palavras são vagas ilusões de compreensão. Os escritos são, assim, ilusões múltiplas, quando passam pelos canos agudos da memória e, depois, chegam aos recôncavos dos dedos. Gritos sufocados estão de baixo do travesseiro. Estão em gargantas sangrando pelos olhos. E as palavras continuam sendo a ilusão de quem tem pressa em dormir, para logo saber o que irá sonhar. 



23 de fevereiro de 2012

13' 02" de reflexão e lentidão acelerada

Por mais que o trem corra ligeiro pelos trilhos, é possível, ainda, enxergar a lentidão que há em nossa própria percepção. É sempre essa contradição, de achar que tudo está parado, enquanto se está em movimento. De achar que tudo está muito rápido, quando, na verdade, tudo está caminhando a passos vagarosos. É poder ver os trilhos se desgastando a cada viagem, mas ainda assim dar tempo ao processo, a todos os processos. É essa louca contradição. Do movimento e do repouso. Do se deitar em um olhar ou se deixar levar por um vento abatedor. Essa dialética difusa, confusa, mas inteiramente compreensível aos nossos sentidos. Às nossas células se desfazendo e dando lugar a outras, mais jovens. É isso. É esse o fim. É nele o recomeço. Algumas coisas precisam morrer, para que outras floresçam.



21 de fevereiro de 2012

Carnaval, desengano

Chega ao fim mais um carnaval. Cai de novo a máscara sobre o chão, e eu volto para aquele vendaval. Tiro as vendas dos olhos e me coloco à prova mais uma vez. Aquela antiga prova dos sete. A prova real de que os números pares já se tornaram ímpares desde a última primavera. A prova real de uma realidade totalmente diluída. Dissolvida entre blocos concretos de adeuses adiados.  Flashes sem luzes agora reacendem aquela última fração de segundos. Um grande segundo grande, que já havia sido enterrado nos túmulos de uma memória ainda em confrontos  internos (in)acabados. Depois de uma queda, você até aprende a voar. Mas depois de uma recaída, você permanece intacto até uma nova melodia subir na avenida.  Se o carnaval é um desengano, espero mesmo poder me desenganar. Mas só até o próximo carnaval chegar. 


15 de fevereiro de 2012

Perpetuum Mobile

E os movimentos elípticos de planetas desconhecidos se fizeram presentes naquele buraco negro sem vida. Os cometas passavam aos ventos  e iam se despedaçando, pousando-se lentamente sobre Vênus adormecido. Enquanto vossas caudas – toda alumiada por poeiras da estrada e gases alucinógenos – costuravam-se por entre as demais nebulosas, enquanto surgia naquele céu uma super nova, para neutralizar uma vez mais aquelas órbitas e, finalmente, trazer as claves de Sol para compor uma canção ainda sem melodia.  


6 de fevereiro de 2012

Meus sentimentos - uma noite no velório

Meus sentimentos. Obrigada. Meus sentimentos. Obrigado.

Este é o básico diálogo estabelecido entre pessoas que se encontram em um velório. Afinal, meus pêsames é pesado demais para um momento já tão pesado. Mas que sentimentos são esses? De onde é que aparecem tantos sentires antes desconhecidos?  Sentimentos da boca pra fora. Sem sentir. (Duvido alguém escancarar, de fato, seus sentimentos. Ainda mais assim, de maneira tão fácil, tão breve). Ah! “Meus sentimentos”.  Acredito que, nesses momentos, um abraço é muito mais válido que esses “meus sentimentos” nunca sentidos.

E assim foi mais uma noite no velório. Já fui a vários. Desde criança eu aprendi a observar as lágrimas de adeus.  Os sinais da cruz em testas geladas. A conversa ao pé do morto.  O “ olá, tudo bem” fora de órbita. E aprendi também a reconhecer o cheiro da morte por meio das flores. E morte, pra mim, tem cheiro de girassol se despedaçando.

Em velório tem gente rindo, gente fazendo piada e muita, mas muita gente bebendo. Pinga, pra esquecer a dor. Café, pra ficar acordado. Chá, pra acalmar os nervos. Remédios, pra não desmaiar. E sentimentos também, por que não? Muita gente tomando emprestados os sentimentos alheios. Comprando dores que nem são suas. Mas essa gente já virou mesquinha, pois não são como as crianças, que pulam e brincam de esconde-esconde mesmo estando no cemitério.

E isso me fez chegar a mais uma conclusão ainda não concluída: as crianças são as únicas que amam sem se deixar levar pelo egoísmo.  São as únicas que não fingem o amor que sentem pelo morto ao lado. Elas podem até estar pulando de alegria, enquanto o defunto está lá de mãos cruzadas. E correm. E dão piruetas. E isso não quer dizer que não amam. Não quer dizer que são frias. Quer dizer apenas que elas viveram ao lado daquele que se foi  o  tempo suficiente pra deixá-lo ir embora em paz. Enquanto os adultos, aqueles mesmos dos “meus sentimentos”, velam a noite inteira um espírito em ebulição. E choram de remorso. E gritam pra dentro de seu próprio ego-egoísta.

Por fim, deixo aqui meus mais puros sentimentos. Infelizmente, também sou gente grande.