Primeiro dia de aula. 1ª série. Minha lancheira era roxa, e o cheiro do
pão com presunto e queijo, preparado por minha mãe, ainda vive na
lembrança. Dalí a pouco, toca o sinal, ela vai embora e eu percebo um
medo crescendo de repente.
Olho ao redor. Um tanto de crianças pulando.
"Será que eles já se conhecem? Só eu que não conheço ninguém?". Menina
tola. Era o pessoal do 2º ano. Senti que, ali, naquela escola com
meninos grandes, eu teria que aprender a me virar sozinha.
1º D.
Professora Ivône. Era uma mulher de estatura baixa. Nem gorda nem magra. Cabelos negros e lisos até a cintura. Parecia uma índia. Uma índia
evangélica, logo percebi, pela saia que levava até os joelhos e pelo modo como falava de Deus nas aulas.
Eu adorava ir à escola e gostava também da Prô Ivône. Ela sempre elogiava
meus trabalhos e, de sobra, ainda escrevia um comentário em todos
eles - Parabéns, ficou lindo, princesa!
Eu achava que aquilo era só
comigo, até ver o mesmo comentário nos trabalhos dos colegas. Um dia,
levei um presentinho pra Prô, um ursinho. Ela adorou. Mas passado algum
tempo, ela começou a dar algumas coisas de brinde para as crianças. E,
poxa vida, ela deu o meu presente para a Daniela. Uma menina que sentava
na primeira fileira do canto esquerdo. Fiquei chateada. Contei a minha
mãe. Aí ela explicou que não importava pra quem ela desse o presente,
pois a professora índia iria continuar gostando de mim da mesma forma.
Demorei um tanto de tempo pra
entender esse dinamismo das coisas, e como nos sentimos proprietários
até daquilo que damos. Passados catorze anos, eu compreendi que nem tudo
que você doa permanece igual. O efeito de transformação excede àquele
cronometrado por seus sentidos e sentimentos. Hoje em dia, enconro a prô
Ivône pelas ruas, ela já com seus 60 e poucos anos, eu com meus 21.
Engraçado, ela continua me chamando de "minha princesinha", mas desconfio que nem se lembra do meu nome.
Nenhum comentário:
Postar um comentário