7 de setembro de 2010

Confrontos internos (in)acabados

Quê calafrio. Pêlos e pupilas paulatinamente transferem-se de lugar. Tomam rumos distintos, mas advindos de uma mesma vertente – o sentir. Sinto as ligações neurônáticas neuraseando minha mente pouco desvairada. Pulsantes elas vão de encontro umas com as outras e teth-a-teth duelam-se. Ah! É a luta da consciência e da moral. Da razão e da emoção. Do viver e do deixar-se viver.

Cigarro. Café. Caneta em mãos. Nada mais constrangedor que olhar o relógio às 02:49 da madrugada e não ver o lado direito da cama ocupado. Mais triste, porém, é perceber que o fim começou antes mesmo de ser início e que o início nunca existira. Fruto de uma mente em aperto e coração embrulhado. Deitei os braços na janela, dei de cara com o vento. Malandro, o rapaz puxou meu cigarro fora. Virou cinzas ao ar, pro ar. Ao menos isso eu posso deixar como herança – as cinzas.

Ouvi o abrir das portas da garagem, o motor resfriando. Até me deu vontade de descer, mas a razão gritou de dentro de mim e subiu aos neurônios já calibrados. Ouvi seus passos vagarosos subindo as escadarias da sala, já era três da manhã e ele não havia nem ao menos ligado, avisando. Era o tudo ou nada. Era de fato, o fim da chegada – de sua chegada.

Seu perfume escoa facilmente em minhas narinas e minha memória não falha, é inconfundível. Finjo estar dormindo ou já o abordo na porta? Calma. Silenciar-se é o melhor remédio para os corações mal curados e também para as desculpas mal lavadas. Entrou, abriu o closet e lá resgatou, sem olhar, aquele seu pijama mais antigo, aquele que mamãe havia lhe dado em nosso primeiro ano de casamento.

Deitou-se ao meu lado e virou-se, como de costume, para fora da cama – e fora de mim. Fora de sintonia há mais de um ano, fora de amor, de sexo ou de dor. Éramos assim como dois planetas que vagam o mesmo universo, porém, separados por anos luz.

Não há nada mais sincero que uma verdade não dita. Não há. Não há eu sem nós, aliás, não existiria gramática, não haveria por quê. Eu é quando nós somos. E nós ser quando tu está. Em Dó maior ou Lá com sétima, arranho o céu ao pé do ouvido. Segredos de liquidificador você encosta em meus lábios, e o  coração vai a mão quando são tuas as mãos que me ouvem. Fico assim ao seu lado, de sentido revirado. Paladar e olfato viram tato. Que tato.

Mas seu silêncio soou tão alto que meus ouvidos logo se tampavam ao que (não) dizia. Não quis ouvir. Me fiz de surda e gritei alto, como se grita uma criança com fome. Foi em um instante uma borboleta em seu casulo, tendo que esperar um dia mais para sair. E você dormiu ali, ao meu lado. Calado. É nessas horas que volto a tomar meu calmante. Com café e um pouco de conhaque. São tantas projeções.

6 comentários:

  1. Interessate, não, não vou usar esta palavra para denominar este seu texto. Começo de novo: é bem sensual, erótico, até. è profundo e muito[...]

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  2. Nossa, esse texto é a minha descrição?!

    Adorei

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  3. Vc é uma das minhas jornalistas literárias preferidas...
    Pra variar, arrasou gata!

    Talento que eu sempre lerei...

    Beijos Gêh!


    CIH*~

    @cinthia_msl

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  4. Volto a repetir, seu texto me remete a Lygia

    muito bom

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