3 de novembro de 2015

Dia de santa

Aparecida do Norte. O domingo era o da semana passada, mas a cena era a mesma dos tantos outros anos que a família seguiu toda em romaria. Meu pai nunca gostou de praia, nunca gostou de campo, nunca gostou de sair. Só festa de santos e visitas às igrejas de sua devoção. Aparecida do Norte, Pirapora do Bom Jesus, Tambaú. Cresci indo a todos esses lugares pelo menos uma vez por ano. Mas a Aparecida sempre foi mais especial. A família toda se levantava cedinho, umas 3h da manhã. O pai, porém, estava de pé muito antes. Colocava uma daquelas camisas que formavam seu estilo "pai-camisa-jeans-bigode" e se sentava à mesa pro café-com-leite. Chegando lá, ele caminhava direto pra dentro do templo. Gigantesco, sempre me senti pequena olhando pro teto e pra uma escadaria sem fim, que de tão longínqua se tornava pequena perante meus olhos. Depois da hóstia tomada, era hora de visitar a imagem da santa Aparecida. Essa fila da imagem também sempre me interessou. Umas pessoas iam ajoelhadas, outras vestiam seus filhos de anjos. Abençoavam pernas, braços, cabeças de gesso, num ato de agradecimento à graça alcançada. Até hoje fazem isso. Logo mais, era a sala dos milagres. Essa não podia faltar. Nunca pode. Pra mim, a parte mais interessante. As correntes que se quebraram de um escravo que era devoto da santa. A pedra com a marca das patas do cavalo do homem que queria entrar na igreja a todo modo. As fotos grudadas no teto. Deve ter foto minha de promessa de dez anos atrás. Eu até levei um violão como oferta. É. Depois, era a hora de atravessas essa passarela aí. Eu e meu pai ficávamos olhando pra baixo. Como era alto. E ele me contando as histórias de gente que se jogava. "Coragem, não?", ele comentava, enquanto aquela multidão de devotos iam e viam, a todo tempo, sem cessar - com seus joelhos no chão quente, suas fitas abençoadas, suas cabeças ao Sol. E a gente seguia rumo a igreja velha, depois a de São Benedito e, por fim, a feira popular, que vendia desde quebra-queixo a roupas de marca falsificadas. Eu sempre pedia um óculos escuro, um rádinho a pilha, um bichinho virtual. Essa foi a segunda vez que visitei Aparecida sem o velho. Até tentei trocar de mal com Deus por me levar meu pai, como diria o poeta, mas essas memórias é que me aproximam do Tiãozão véio.

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